É verdade que quando o estúdio Ninja Theory, o mesmo que nos trouxe games excelentes como DMC: Devil May Cry, Enslaved: Odyssey to the West etc., disse que seu mais novo game, Hellblade: Senua’s Sacrifice, seria baseado em uma personagem que sofre de psicose, era muito difícil imaginar a dimensão e profundidade que tal projeto teria para aqueles que desconhecem os detalhes de quem sofre dessa patologia.
Mas, sinceramente, a campanha de Hellblade, que dura aproximadamente sete horas, possivelmente, se tornou a mais perturbadora que já presenciei em um game. Em Hellblade: Senua’s Sacrifice, encontramos uma guerreira celta, a Senua, que sofre de um tipo de psicose severa, após experimentar um imenso trauma de seu lar ser invadido e destruído por guerreiros vikings. Na verdade, essa personagem deve ir até Helheim, o mundo dos mortos na mitologia nórdica, governado pela deusa Hela, para levar o crânio de seu amado Dillion e ser capaz de negociar com a governanta desse lugar e salvar alma de Dillion de volta ao mundo dos vivos.
O mais interessante de Hellblade é que ele não apresenta sequer um HUD, aqueles elementos informativos que aparecem na tela, como a barra de vida ou de golpes que podem ser feitos pelo personagem, ou tutorial, informando ao gamer o que ele precisa fazer para passar de fase e isso deixa a experiência de jogá-lo nua e crua, com bastante estranheza e diferença dos games de ação que nós estamos acostumados a jogar.
Enfim, acredito que de forma abstrata isso seja apenas mais um dos elementos que completam a proposta da Ninja Theory de representar os problemas mentais que Senua enfrenta. Outro ponto importantíssimo a se considerar é a parte dos puzzles, ou quebra-cabeças, que são muito bem elaborados, na minha opinião, e intimamente conectados ao cenário e contexto do game, no geral.
Alguns deles são mostrados em certos momentos do game, como uma condição a ser cumprida para você passar de fase e que podem deixá-lo tenso por causa dos limites impostos até você alcançar o objetivo final, enquanto outros aparecem em todo o game e podem frustrá-lo pela repetitividade em que aparecem no decorrer da campanha.
Por exemplo, um desses puzzles repetidos envolve a busca nos elementos do cenário que imitem o mesmo desenho das runas nórdicas presentes em cada portão e, assim que tais desenhos rúnicos são avistados nos cenários do game, o portão é desbloqueado para progredir até a próxima fase.
De qualquer forma, se por um lado, é incrível o modo no qual a Ninja Theory usou para representar os problemas psicóticos de Senua de acordo, com as mecânicas do game, por outro lado, é muito difícil mensurar a perturbação que uma pessoa com problemas mentais tem em escutar vozes, gritos, sussurros e barulhos estranhos na sua mente, enquanto ela tenta se concentrar em fazer outra tarefa. Mas, Hellblade: Senua’s Sacrifice nos permite ter a sensação de como seria presenciar um transtorno mental igual ao que Senua sofre e isso é feito de forma exemplar.
Talvez, o combate não seja a parte crucial de Hellblade, o qual aparece em partes mais específicas do game, e, embora haja breve momentos que a câmera do game não funcione bem, as batalhas contra os inimigos e chefes acontecem de forma suave. Vale a pena dizer também que há uma boa variedade de inimigos, normais e chefões, e eles exigem um tipo diferente de abordagem para ser derrotados, o que é mais um ponto positivo para o game. Porém, é crucial dizer que Senua não teria o mesmo impacto sem sua intérprete na vida real, a alemã Melina Juergens, com sua excelente performance para representar todo o sofrimento que Senua tem em expressões faciais e do próprio corpo da personagem convincentes.
O uso do áudio 3D, que capta o som vindo de diferente lugares para os nosso ouvidos, e a trilha sonora aqui também estão de parabéns, por tornar a imersão do jogador em Hellblade ainda maior, ao ponto de você se sentir completamente dentro das preocupações daquele universo. Por isso, é fundamental você jogar com um headphone, se quiser ter uma experiência mais completa.
Enfim, Hellblade: Senua’s Sacrifice apresenta uma narrativa intensa do início até o fim e quem curte a mitologia nórdica pode se surpreender e amar a forma como a sua história é contada, cheia informações dessa cultura, pelo ponto de vista de uma pessoa singular e especial. No início, pode parecer até que o game é bem estranho, porque não possui nenhum HUD na tela, apresenta uma personagem que tem alucinações visuais e auditivas o tempo todo e puzzles resolvidos pelo ponto de vista de algum objeto ou de uma forma que comumente não se vê por aí.
Mas, com o tempo, você consegue se adaptar a essas mecânicas diferentes e perceber que Hellblade tem o seu valor, como um título que, ao meu ver, foge bastante do padrão de superprodução dos games de ação e ainda te passa a sensação de presenciar tudo o que Senua acredita ser real, mostrando que, infelizmente, não há tranquilidade no seu mundo perturbador.
Obs.: Ah, se você quiser ver o mesmo conteúdo dessa crítica, mas em formato de vídeo, deixei abaixo o vídeo que fiz criticando Hellblade: Senua's Sacrifice. Espero que goste de ambos, tanto do texto quanto do vídeo. 😊
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